quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Lu Bastos

Luiza Bastos (Lu Bastos) é uma poeta e produtora cultural nascida em 1998 em Madureira, no Rio de Janeiro.
Sua escrita poética, confessional e livre, por vezes adota os contornos da prosa e se aproxima muito do tipo de narrativa que se faz de maneira espontânea, seguindo o fluxo de consciência.
A Lu tem como referência as suas vivências na Baixada Fluminense, bem como boa parte dos e das poetas que a compõem. Ela afirma que encontrou na poesia uma forma de respirar e sobreviver ao mundo, e diz que os poemas fazem parte do seu dia a dia e costuram suas fases de vida, ora boas, ora ruins, porém sempre líricas.




Eu não gosto de Ana Carolina

suja de pétalas
das flores que deu pra outra
e de nojo da tua orelha
onde ela consegue alcançar
com resquícios
de traição e paixão
me arranco da tua pele
e de teus escritos
te condenando a dor
de não me ter eternizada
no papel,
somente no beijo confortável
que só eu posso te dar
sendo assim, me recolho
espero o sino marcar
19h em ponto
e morro dentro de ti
pois o que ta vivo
grita
ama
e
morre
essa é a minha lei:
vivo viva porque
morro sempre que possível
e, há vidas atrás, voltava por você
hoje volto pela outra
a qual você manchou nossa cama
com o sangue e suor
do teu ato falho e sem pudor
dessa vez, por infelicidade
não encontrei moedas pelo chão
mas sim aquele vestido
azul clichê que te dei
pra eu te despir
doeu
mas tomo um café
fumo todo teu cigarro
te escrevo por 13h seguidas
enlouqueço
e me faço uma tela
onde deixo sangrar em mim
um lindo quadro abstrato;
me faço perfume
cocaína
e enfim
poesia.



#



Resposta ao poema "Carta" do poeta Guarnier

Hoje é um bom dia pra escrever uma carta. 
Li no jornal que uma tempestade se aproxima da tua casa. Sugiro que conte os passos até aqui e espere a chuva passar. Reconte. São só sete passos - um para cada dia -, três cigarros, um cheiro e o beijo eterno que marca o fim da noite. 
Eu tiro tua roupa do meio do caminho, garanto que tiro. Em seguida tiro a roupa que atrapalha teu caminho até mim.
Espero que o tempo demore a passar. 
Você cozinha, eu arrumo o lençol.
Você se queima, eu fecho as janelas.
Você se serve, eu tiro a mesa.
Depois disso o tempo correu. Voou. Mas medi o tempo certo pro teu suor se contentar com o meu. Foi tudo feito em tempo. E agora já não há mais tempo pra contar, medir ou cronometrar. 
Hoje está um lindo dia pra ser domingo, eu olhei no Astros. Li a combinação dos nossos signos e nenhuma parte nos interessa mas tudo que li é lindo. 
Descobri que sua Vênus é em Marte e por isso tua fé é só no amor. Mas Deus perdoa, esteja certa disso. 
Porque hoje está um dia lindo pra fazer poesia e deixar a solidão de lado, mastigada pelos novos tempos de euforia, jogada na calçada mais próxima e condenada a ser só solidão. 
É baby, hoje está um lindo dia pra fazer poesia. Prometo que está. 
E se puder, venha só com o amor. Dou a cara a tapa. Me bata! Eu não vou me defender, você sabe que não. Do amor eu apanho.



#



O texto de amor que eu teria enviado se na verdade não fosse um texto de morte após a morte 

​existem sequências de palavras que tiram o ar e desmontam o peito
e algumas que roubam as palavras das bocas das outras pessoas e elas não sabem o que dizer.
e ainda existem as palavras que nem existem mas que se você olhar dentro de você, as encontra em forma de sentimentos que você nunca conseguiu entender, só sentir. 
essas são as palavras que eu gostaria de te escrever nessa segunda feira, essas palavras que não são formadas através de letras e sim por cada beijo lento que você me dá quando decide arrancar minha alma, por cada “eu te amo” que você fala como quem come lasanha de quatro queijos e quer outra. eu quero lhe escrever as palavras que você escreve em mim toda vez que fica nua e encaixa teu peito no meu. 
eu não sei porque eu ajo como se você fosse só uma brisa passageira se eu sei que você é um mar inteiro, forte, revolto, que vira e mexe vem acompanhado por um vento quase tão frio quanto as noites são sem você do lado.
eu não sei de mais nada além da dor que eu sinto por sentir por você tudo que eu sinto, da forma que eu sinto, com a força que eu sinto, mas eu desisti de lutar contra isso. você é a minha palavra preferida, meu poema mal escrito, meu tom de pele preferido, minha marca no pescoço mais duradora, meu perfume mais lembrado, meus dias com as noites mais longas, você é a meta à ser atingida, a noite de sexo mais gostosa, o medo mais incrível de sentir. você é o meu dia 25, meu dia 29, meu dia 26, e em julho você é o mês inteiro.
correr disso é muito mais difícil do que resolver arriscar, do que tirar toda a minha roupa e todas as malhas que me cobrem a alma porque eu não consegui deixar de me fazer de perfume, mesmo que o seu cheiro preferido seja outro. a essência do perfume que eu sou hoje é o teu sorriso que é a única parte sua que eu consegui memorizar até agora e ele fica mais lindo ainda nas minhas lembranças borradas pelas lágrimas que me escorrem agora.
eu não sei o que você fez comigo ou o que desejava fazer. eu nem sei se você tem consciência da história que a gente tem (ou da que parece existir só na minha cabeça), mas eu preciso entender tudo isso, preciso me sentir segura pra dizer que existe um amor que é nosso e não só meu. preciso alguém que decida de uma vez por todas viver comigo do jeito certo que se vive com alguém porque eu cansei de não saber mais pra onde ir com você, cansei de pisar num chão de giz de cera. eu quero riscar estrelas no chão e te passear no céu porque você ainda é meu pedido pra toda estrela cadente nesse céu cruel da baixada fluminense.
eu queria memorizar tudo isso que estou escrevendo agora pra te dizer com a minha voz e queria que passássemos esta segunda-feira da forma que planejei mentalmente e queria você aqui do meu lado, depois de um dia de trabalho e queria demais te servir o jantar que demorei horas pra decidir qual seria porque eu só conseguia pensar em te dar logo a sobremesa que você não come já faz um tempo e eu sinto muito por isso. mas eu não tive força nos últimos dias, não tive a menor condição de levantar meu corpo e sentir de verdade a ventania do último mês porque a bagunça da vida já me deixa louca o suficiente. e o buquê que eu planejei comprar é mais caro do que eu pensei. e tá doendo mais do que eu penso que posso aguentar sóbria, então deixo que as palavras me ajudem e tô aqui te escrevendo.
escrevo pra que saiba que todos os nossos beijos no último ano foram os meus preferidos, que dormir sem você é horrível e que se dependesse de mim eu dormia contigo todo dia. não sei mesmo a data do teu aniversário mas sei a do nosso primeiro beijo mas gravaria uma e esqueceria a outra se você quisesse. 
eu quero a última chance e mais nenhuma. quero fazer dar certo. não aguento mais tentar te esquecer de mês em mês. quero me comunicar com você, quero você, a gente.
eu tô morrendo de saudade.
e sim, saudade mata sim, bem devagar e cada pouco que ela cresce, parece que mata novamente.
me perdoa por todo silêncio e ausência até agora. por todo grito contido e toda amostra grátis da minha maneira errada de mostrar que amo. me perdoa por sempre duvidar e por esse medo cítrico de confiar, de acreditar, de baixar a guarda e me entregar de verdade. me perdoa por todo passo torto até aqui.
desejo de corpo e alma que ainda me queira e que a porta ainda esteja aberta.

se olhar nos meus olhos vai ver que ainda não acabou e espero que nos seus também não tenha acabado.