terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Regina Azevedo

Regina Azevedo é uma poeta brasileira nascida em Natal (RN) em 2000.
Autora dos livros Das vezes que morri em você, Por isso eu amo em azul intenso e Pirueta, além de alguns fanzines.
Acompanhe mais aqui: www.reginazvdo.tumblr.com




Gabriel


pense na banalidade
de aprender a contar
até o infinito

nesse momento
eu gostaria de virar a Terra
ao avesso

e plantar estrelas 
no caminho do seu tropeço

para que você pudesse
brincar de astronauta

e se deparar com as flores laranja
e a juventude com seu nome 
ressoando feito mantra

I wanna hold your hand

e atravessar a escuridão
e modificar o sentido de infinito,
que agora se diz Gabriel

sua luz pisca um segundo
e brilha um mundo



#



só por um segundo
sob teu peito

o farfalhar do outono
e o que você fazia
em festejo ao fogo

a ponta dos dedos
ao relento

traquejo singular da labareda

misto de calmaria e lampejo
numa dança descabelada

a língua pronta para o surgimento
da manhã

o espírito de cavalo colorido
no ato de trocar os óculos com você
e te olhar de baixo

o minério que dorme na pele
o desafio que doma o segundo
a ginga que derrete as ondas

cheiro tônico diante do espelho

o rugido e o anúncio 
do tropeço no ritual:

um orgasmo estupendo
anestesia contra bombas
de efeito moral



#




Beijar você


Beijar você 
na queda livre da montanha 
russa – feito embrião
aprendendo a dar cambalhota. 
Bolinhas cítricas explodindo
na língua. Um trote 
desafiando a gravidade, 
o batom vermelho desejando 
pular da minha boca pra sua.

Nosso toque parece,
a olho nu, 
Uma boiada pisoteando 
uma teia de flores
Um filhote de orca separado
da família. 
Mais de perto, a mão que passeia 
é a mesma que dança
Nossos ombros unidos
fazem brotar orquídeas ou margaridas.

O que há de mais bonito é 
A espessura do seu batimento cardíaco 
A cor que meu cabelo adquire 
de acordo com o raio da sua visão. 
Sua pupila dilatada 
muito perto da minha pupila dilata. 
Seu sorriso diante da minha clavícula, 
da ideia de estação, 
do pensamento de que tudo, 
inclusive o que se esconde na linha do horizonte, 
é pura beleza.

Tudo, absolutamente tudo, 
Mas no ponto mais alto do pódio
beijar você na queda livre
da montanha russa.




#




em mar aberto


desenterrei do meu baú a pipa
construída num sonho. percebi 
que não sei pedalar em linha reta,
que tenho nos joelhos uma fissura
de loucura de viver em mar aberto. 
sinto saudade do seu nome 
como quem tira as botas ensanguentadas
ao regressar da guerra. mergulho
meu peito palácio em água fervente
e admiro religiosamente a foto 
que consta no rg recém fraudado. 
é preciso dizer aos viajantes
que as dunas são proibidas
embora bonitas. assim como
fechar os olhos ao sentar no colo de alguém
ou pensar mais de três vezes
por dia em quem te puxou
pra dançar. é proibido amar, 
é proibido soprar um dente de leão
pra espantar o medo.
assim como é proibido encontrar 
e lamber com vontade o mar aberto que existe
no meio de cada pessoa. a sorte 
é que nesse momento, diante da cerca elétrica,
da placa, da assinatura de autoridade,
finjo não saber ler 
absolutamente nada 




#



sinto muito não ser assim suave
você disse que aquele pássaro
era da cor do meu cabelo

mas ele era vermelho

e nosso amor está em algum lugar
entre o voo e a extinção da espécie

meu cabelo é laranja 
laranja porque sou poeta
(e prefiro ter cara de poeta
a ser bonita)

você estava andando na rua
viu um pássaro
e lembrou do meu cabelo


isso diz muito sobre 
seus olhos
esses, sim, vermelhos

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